domingo, 28 de junho de 2009

Crítica construtiva. Ou não.

Que me perdoem os reciprocamente apaixonados e os casaizinhos bonitinhos e fofinhos-inho-inhos, mas hoje eu vou falar mal do amor. Se eu pudesse aconselhá-los, diria até para não lerem este texto, ou, se assim o quiserem, para que não me levem a mal e tentem encarar as palavras friamente e sem hipocrisia.

Não é uma crítica ferrenha à idéia do amor, mas à maneira com que ele se manifesta. Pra mim, ele foi distorcido. Deixando claro aqui que, o que quer que eu fale, não está verdadeiramente generalizado. Talvez, em toda a minha existência, eu já tenha visto um ou outro caso que foge completamente a todas as características que aqui serão relatadas. Eles se sustentam e sorriem ao saber que estão contradizendo o mundo inteiro.

O amor que vemos hoje em dia se traduz muitas vezes em posse, em exigência, em fingimento, em ciúmes, em egoísmo. Certa vez, numa roda de amigos, um professor de literatura (que, além de ser professor, criara vínculos de amizade sincera conosco) estava nos contando um fato curioso: “Eu estava na sala da minha casa e a minha esposa, na época, conversava com uma amiga na cozinha. Ela não deve ter percebido que eu estava ali e falava alto. Eu não estava prestando atenção na conversa, até que a ouvi dizer meu nome.
‘– Fulano pensa que eu gosto de Clarice Lispector. Eu a odeio! Só falei que gostava, mas nunca foi verdade.’ Tudo bem, eu não fiquei chateado ao ouvir isso, afinal de contas, eu nunca ficaria com raiva por uma pessoa não ter os mesmos gostos que os meus, mas foi ali que eu comecei a perceber que eu não conhecia a pessoa com quem eu dividia minha vida e que essa pessoa seria capaz de mentir pra mim até nas coisas mais simples, como gostar ou não de uma autora. Não preciso nem dizer que, hoje, não uso mais aliança nenhuma.”

O problema foi a Clarice? Não, não foi. Eu mesma confesso que tinha certo “medo” dela até bem pouco tempo atrás. Não tinha aprendido ainda a senti-la, mas, agora, devoro-a como quem busca alívio para um mal incurável. Não, não foi a Clarice. A intenção de agradar o outro dizendo algo que não é totalmente verdade pode até ser boa, mas garanto que a sensação de saber que a outra pessoa a ama mesmo sabendo dos seus defeitos é muito mais grandiosa.

Talvez as pessoas pensem que, para amar, é preciso possuir a outra pessoa. Não, não é preciso. Deus nos deu o livre arbítrio e tornou-se invisível para nós, ao menos no aspecto da visão, mas o fato de ele ficar nos observando sempre e dizer “venham a mim, pois eu estou aqui e os salvarei se assim o quiserem” é a maior prova de amor que pode existir na face da terra. Ele não nos manipula, nem nos governa, nem se ensoberbece do que fez por nós. Ele não espalha aos quatro ventos que Jesus se sacrificou pela humanidade para que digam “oh, como ele foi bonzinho”. Nós, os interessados, sabemos desse sacrifício. Só quem interessa precisa saber. Talvez por isso eu não goste dos tais carros de loucuras de amor. Você paga uma pessoa estranha pra dizer o que você mesma deveria dizer. Mas, não se contentando com isso, ainda deixa claro que tudo precisa ser exibido e gritado em alto e bom som, pra que os outros ouçam e pensem “nossa, como eles se amam!”. Na verdade, o inferno são os outros. Deixar-se atingir por peçonhas alheias também destrói qualquer tipo de estabilidade. Eu sei disso porque vi com meus próprios olhos e posso atribuir claramente a esse tipo de desgaste o fato de as duas pessoas mais importantes da minha vida não estarem juntas agora. Não posso sequer fazer um aniversário em que os dois estejam presentes. O inferno? São os outros. Não posso nem imaginar em significar algo assim para alguém ou alguéns, me dá asco, eu simplesmente não conseguiria ser assim ou sequer pensar em ter a palavra “peçonha alheia” atribuída à minha pessoa. Eu levo a sério a historinha de ‘não fazer para os outros o que você não gostaria que fizessem para você’.

E, exatamente por não conseguir tal proeza, eu preciso voltar à minha encruzilhada. Nela, sempre existiram mil caminhos tentadores, que conduziriam a uma realidade fácil, mas, provavelmente, fingida. Eu tenho tendência a fugir de superficialidade, então optei pelo caminho mais difícil. A própria denominação pressupõe impropérios. Só depois de muito tempo, percebi que já estava no meio dele e que não mais havia saída. Um muro muito maior que eu mesma, colorido e bonito me impede de prosseguir. Que fazer, então? Não sei ser peçonhenta e não tenho forças pra sequer pensar em destruir qualquer resquício de muro, por mais minúsculo que seja. Só me resta voltar pelo mesmo caminho que percorri e só então enxergar a quantidade de pedras que, nele, havia. Eram imensas, fragilizariam qualquer um. Como eu consegui passar por elas no caminho de ida? Honestamente, não faço idéia. Não há mais cor na minha visão, elas me foram tomadas e eu só consigo enxergar em preto-e-branco. Em compensação, eu não preciso mais passar por cima dessas pedras, basta desviar delas e tentar não pensar em como prosseguir normalmente. Na volta, a dor foi embora, mas levou consigo as cores. O que deixou? Vazio. Como tapar uma cratera imensa com uma pá minúscula em que não há terra? Como cobrir o vazio com mais vazio? Incógnitas que eu, pretensiosamente, me meto a descobrir. Juro que divulgo a fórmula assim que chegar a alguma conclusão. Talvez eu fique rica com a divulgação dessa tal fórmula e tenha a ilusória sensação de ser amada pelo que sou, quando, na verdade, seria amada pelo que tenho e pelo que proporciono com o dinheiro ganho. Solução? Não, não mesmo. Se é pra ser assim, prefiro mudar de idéia e guardar a fórmula só pra mim.

Pode ser uma comparação idiota, talvez ocasionada pelo excesso de estudo de História, mas eu costumo associar a idéia de amor à idéia de socialismo. Estranho? Não tanto. Por favor, não pensem que o meu intuito é fazer com que todos vivam numa poligamia sem limites em função da “divisão dos meios de produção”. Jamais! Eu nunca pensaria em algo assim, sou uma moça direita! O ponto a que eu quero chegar é a distorção das idéias naturais do socialismo, que o transformaram numa realidade autoritária ao invés de algo proporcionador de bem-estar comum. Em meio à Primavera de Praga, as pichações dos muros na Tchecoslováquia lamentavam: “Lênin, eles enlouqueceram!”. Do mesmo jeito que o socialismo foi utilizado para dominar, o amor ainda é utilizado para chantagear e fazer outra pessoa agir sob o domínio de meros caprichos do ego. A humanidade enlouqueceu e esqueceu da primeira lição que nos foi ensinada: o amor. Porque foi do amor que nós nascemos e, se há algo por que valha a pena morrer, é por amor. Não por achar que a religião X é melhor que a religião Y, por uma lama preta que é cemitério de vidas existentes há bilhares de anos ou pela disputa de um pedaço de chão.

O que eu acho é que nada substitui uma surpresa num dia comum, não numa data comemorativa. Nada substitui três palavrinhas ditas sempre que der vontade, sem receio nenhum de estar sendo pegajoso ou sentimental demais. Sinceridade, honestidade e, acima de tudo, reciprocidade. Eis a utopia. Acredito um pouco nela, tanto é que uma parte de mim ainda gosta de presentear as pessoas que eu amo sem data marcada e sem motivo aparente. “Lembrei de você, só isso”. Nada de gastar dinheiro demais. Juro que não é avareza. Prefiro gastar meu tempo, minha pouca criatividade e minhas próprias mãos para construir algo de bom e, assim, ver um sorriso no rosto de quem eu quero bem por um motivo que veio de mim e é significativo, não de alguma loja que trocou um presente qualquer por alguns pedaços de papel com números.

Por favor, não me contradigam nem tentem me consolar dizendo algo do tipo “calma, você vai encontrar qualquer coisa de bom quando menos esperar”. O problema é exatamente esse. Minha parte sentimental é socialista utópica e a essência do socialismo morreu em todos os sentidos. Hoje, vivemos num mundo em que uma pessoa é capaz de apontar uma arma pra uma criança de uns 7 anos pra tomar uma supérflua câmera digital. E a criança, vai ficar traumatizada pelo resto da vida por causa de um papel sujo estampado por tais números? Vai sim, vai ficar. Como isso é irrefutável, eu tenho plena certeza de que não vou conseguir, já aprendi a lidar com esse fato. É utópico demais. Não, não vou conseguir. Como na Primavera de Praga, eu repito: “Lênin, eles enlouqueceram”. Parafraseando, repito: Deus, eles enlouqueceram. Por favor, faça com que tudo isso tome algum rumo menos frio. Que haja mais amor, aquele que é verdadeiro e sem exigências, no mundo. Mesmo que não seja essencialmente para mim ou por mim. Mas que, pelo menos, seja. Aconteça. Que seja doce.

quarta-feira, 17 de junho de 2009

Anoitecer (Sobre a abrangência de uma imagem).


Anoitecer. Para ela, a hora mais poética do dia. Adorava o fato de sair do trabalho na mesma hora em que o sol também terminava o seu expediente naquela parte do planeta. Ao despedir-se de mais uma série de afazeres planejados e repetitivos, porém, cumpridos com destreza, deixava-se levar pela música de que ela tanto gostava e que agora tocava no som do seu carro, num volume moderado, para que não fosse preciso esforço algum para sentir a respiração alterando-se conforme o ritmo e para que a mágica melódica não se quebrasse.

Não, ela não gostava do seu trabalho. Por sorte, só precisava ficar ali por algumas horas. Tinha orgulho de ter passado em um concurso público com seus 20 e poucos anos, embora não tivesse um cargo astronômico e nem tivesse sofrido horrores para passar naquela prova. Era apenas suficiente. Sentia-se bem em um emprego que não a atraía, por mais estranho que isso possa parecer. Em experiências passadas, concluíra que quando se passa algum tempo num lugar que não agrada, o resto do dia torna-se muito mais atraente. Quando o dia inteiro é ao menos suportável e sem alegrias inesperadas, a vida acaba tornando-se maçante. Há muito tempo, vivera algo assim e nunca conseguia esquecer essa época, por mais que tentasse. Ao menos esta lição estava gravada: não se pode esquecer tudo. Agora ela tinha algo por que esperar, mesmo que fosse apenas a sensação de estar bem em um determinado local. Passara cerca de um ano trabalhando como se não ganhasse salário algum e guardara tudo o que recebera para comprar seu primeiro carro. Agora que tinha conseguido, podia dar-se ao luxo de entregar-se aos seus prazeres literários e musicais. Todas as semanas, fazia questão de ir a um sebo em especial, localizado em um lugar significativo. Não gostava muito daquela rua, ela trazia-lhe lembranças de um passado que lembrava magma. Ao passar por ali, sentia a ameaça de erupção, embora tentasse se controlar até lograr êxito. Vez em quando, gostava de comprar alguns livros novos, só para sentir aquele cheiro tão especial de páginas praticamente intocadas. Era o máximo de alteração que se permitia fazer em sua rotina.

Nesse fim de tarde, ela queria esse cheiro. De livro novo, de ar-condicionado, de piso polido. Estava bem vestida, gostava de cuidar de si e até que tinha boa aparência. Disfarçava-se muito bem no meio da sociedade hipócrita na qual se incluía. Foi ao shopping mais próximo, adentrou a livraria enorme que era fonte dos seus pequenos luxos literários, escolheu um exemplar que lhe agradasse e foi embora. Simples assim, sem mais delongas. Ao voltar para o carro e pôr o livro no banco do passageiro, que raramente era ocupado por outra coisa que não fossem livros, cd’s ou instrumentos musicais, relutou em sair dali. Talvez por não haver música, como um radar que passa a captar o sinal com mais nitidez quando não há interferência, ela conseguia prestar mais atenção no que acontecia ao seu redor e tinha a impressão de ter visto uma silhueta conhecida ali por perto. Ao se dar conta disso, ligou o carro o mais rápido que pôde e saiu dali praticamente voando. Era a erupção, de que ela tanto fugia e que, naquele momento, fazia questão de ir ao encontro dela.

Aos poucos, foi diminuindo a velocidade. Ela devia ter visto algo errado. Mesmo que fosse quem ela pensava, a consciência de que não é tão fácil assim dividir a mesma cidade, mesmo que esta seja extremamente grande e movimentada, começava a chegar à sua mente. O magma não chegou a explodir e se transformar naquela onda de luz e calor tão fortes que ela jamais poderia imaginar sua intensidade, apesar de estar dentro dela mesma. Ainda bem. Pôs uma canção mais calma e dirigiu-se à sua casa.

Certa vez, alguém lhe dissera que nós não somos o que mostramos. Temos uma caracterização de nós mesmos, uma capa que utilizamos perante aos outros, para fingirmos que somos normais e para que acreditemos que os outros também são. Só somos o que realmente somos quando entramos no nosso quarto, sem mais ninguém, e giramos a chave. De madrugada, durante as insônias, os turnos de estudo, as leituras e as tentativas de usar palavras para descrever nosso próprio mundo. Talvez por isso ela gostasse tanto da noite. Quando a claridade do sol dava lugar à tímida luz da lua, as pessoas descobriam-se, aproveitando furtivamente a leve escuridão.

Como num ritual, tirou todos os objetos da bolsa, preparou o material que levaria para a faculdade na manhã seguinte - a parte interessante do dia, quando ela se sentia mais próxima da felicidade ao lidar com uma profissão que ela realmente escolhera e que realmente pretendia seguir, tão logo acabasse o curso -, guardou o livro num lugar reservado aos exemplares não-lidos da sua estante, tomou um banho relativamente demorado e parou em frente ao espelho. Ali, conseguia dividir duas imagens. O futuro que estava se desenhando e o futuro com que ela se permitia sonhar.

O destino palpável era feito de continuidade. Uma mulher razoavelmente bonita e com razoável estabilidade financeira. Politicamente consciente e dona de uma inteligência admirável que, com o passar dos anos, acabaria se perdendo. O gosto pela música ia, aos poucos, sendo deixado de lado, mais por medo de despertar algo perigoso dentro de si que por falta de talento. O que tinha era metade. Traços de si guiados pela mão invisível do tempo e da solidão. Razoável e nunca completo. O perigo maior atendia pelo nome de sentimento.

O futuro idealizado tinha como base uma simples foto. Quando estava nos seus períodos racionais e excessivamente ligados à rotina, ela escondia aquela imagem numa gaveta qualquer, sob o argumento de não querer ser aprisionada por um fantasma que não mais existia. Dias ou meses depois, ela percebia que estava esquecendo a composição daquele cenário, daqueles rostos, daquelas cores. Era como se ela estivesse matando algo de bom que existia em seu próprio interior. Procurava com afinco, quase desesperadamente. Escondia aquilo tão bem que não sabia mais como encontrar. Depois de algum tempo, após desarrumar todo o quarto, encontrava a foto. Prendia o papel monossilábico ao espelho, como se, assim, pudesse prendê-lo à sua realidade. Quando olhava em volta, percebia a desordem do quarto. Seria uma materialização da sua mente? Ela tinha certeza que sim.

Naqueles breves instantes que pareciam durar uma eternidade, ela deixou que o mundo real escapasse dali. Estava num daqueles dias de desapego ao cotidiano, o novo livro na sua estante servia como prova irrefutável disso. A foto estava presa ao espelho e a sua mente estava, aos poucos, se reorganizando. Como se a dona do quarto arrumasse tudo com preguiça, objetivando deixar a bagunça permanecer pelo maior tempo possível. Ela estava arrumando lentamente, mas ao menos estava arrumando. Queria justificar para si mesma que estava fazendo algo para recuperar sua estrutura rotineira, ao mesmo tempo em que desarrumava alguma gaveta de maneira furtiva, tendo que, inevitavelmente, arrumá-la de novo.

Fazia tanto tempo, tanto tempo... Desde que aquela imagem e aquela palavra foram deixadas para ela com o intuito de justificar a ausência que ela não acreditava que fosse durar muito, passara a acreditar plenamente que um simples monossílabo pode definir tudo. Ao contrário do que pensara na época, a ausência durou. E durou muito. No começo, ela deixou-se levar por aquelas letras e levantava hipóteses, revendo suas atitudes e pensando no que poderia ter modificado aquela situação. Mas os meses foram passando e trazendo a realidade consigo. Se os sentimentos não podem modificar a realidade, o tempo pode modificar os sentimentos. Nos dias que se arrastavam, ela conseguia controlar seu coração quase que completamente. Exceto nos períodos de quarto bagunçado, quando ela gostava de lembrar daqueles olhos, daquele sorriso de canto de boca e daquelas músicas, além de se permitir um pouco de tristeza pela impossibilidade de despedir-se. Era o futuro sonhado que insistia em se fazer presente, como lava de vulcão que, ao iluminar, também queima. Sentiu a presença do magma naquele fim de tarde, e tal fato a assustou. Preferia pensar que aquilo era um simples desvario causado pelo cansaço e pela desordem recente que se fizera no seu quarto e no seu mundo ao procurar aquela foto novamente.

Campainha tocando. Estranho. Pouquíssimas pessoas a visitavam. Suas amigas estavam, provavelmente, saindo com seus namorados perfeitos e aproveitando a noite que derramava um luar tão doce. Saiu da frente daquele espelho, parou em frente à porta. Abriu. Pensou, por um instante, que estava olhando aquele papel e aquela palavra novamente. Eram os mesmos olhos da fotografia, acrescidos por um toque a mais de beleza e de brilho dado pelo tempo. Não, ela não fizera desvarios naquele fim de tarde. Ele voltara à cidade e estava realmente ali, na sua frente, ressuscitando do quase esquecimento como fênix.

Muitas explicações faziam-se necessárias e não havia espaço para monossílabos ali. Os laços invisíveis, que antes foram cortados pela distância e pela ilusão de que conseguiriam ser plenos ao separar-se, acabaram reatando-se. Como há alguma magia obscura em tais noites, ouve-se a voz de Chico, cantando baixinho "Te dei meus olhos pra tomares conta / agora conta, como hei de partir?". Provavelmente, o som vinha de algum vizinho solitário contagiado pela lua e perdido entre acordes apaixonados e uma sala vazia. A lua distribuía mais luz, como se soubesse da complexidade daquele momento. Da janela da sala, era possível sentir um vento leve e cálido, como lava de vulcão que não mais agüenta ficar presa nas entranhas de uma montanha fria e sólida e resolve se manifestar, trazendo toda a luz e todo o calor que guardou por uma cronologia indefinível.


PS.: Pra ficar menos confuso, basta reler o "Agridoce (Sobre a abrangência de duas letras)". Acho que está a uns dois posts atrás. Esse aqui provavelmente sofrerá algumas modificações para se tornar mais coerente, mas serviu pra mostrar o outro lado da história e deixar as coisas inconclusas. :)

domingo, 14 de junho de 2009

De ontem em diante serei o que sou no instante agora.

A partir de hoje, prometo trocar os lugares. Parar de pensar nas outras pessoas e no que pensariam, no que falariam, em como agiriam ou julgariam as minhas atitudes. Parar de esperar por atos de bondade que não vêm e fazer o possível para realizá-los por mim mesma e para mim mesma. Prometo reorganizar absolutamente todas as minhas idéias e todas as minhas pendências. Trocarei os textos digitados pelos escritos, uma tela de computador pela musicalidade das seis cordas do meu violão, uma manhã sonolenta e inútil pelo meu vício incurável por livros. Prometo não criar expectativa nenhuma pelo meu aniversário, a não ser aquela já anunciada pela vinda do meu novo instrumento. Irei batizá-lo com o nome de algum personagem importante. Prometo pensar nisso tão logo o meu novo companheiro musical chegar. Prometo ouvir mais samba e usar a introspecção de Clarice e o realismo não-hipócrita de Machado para me distrair. Prometo voltar a tocar todas as peças de música clássica que já toquei nos tempos em que tinha aulas de violão e tinha o prazer de ouvir algo do tipo “você é muito musical” na voz daquele que me mostrou o poder que os sons e os silêncios têm. Prometo fechar os olhos para todo e qualquer tipo de hipocrisia e, mesmo sabendo suas exatas pretensões e sua verdadeira face, fazer com que meu lado amável se sobressaia. Prometo não mais me entristecer se me falarem que meus textos são melancólicos e psicológicos demais. Prometo deixar de me permitir dias nervosos acompanhados por canções tristonhas e prometo continuar não gostando de diminutivos. Insônias? Nem pensar. Se elas vierem, que sejam acompanhadas por algum samba ou por fatos históricos. Prometo não deixar meu lado infantil morrer e continuar percebendo a magia existente nos detalhes. Mesmo assim, prometo continuar não me deixando levar pelos ares de criança e continuar tendo aversão a qualquer denotação negativa de infantilidade. Prometo conseguir ser ainda mais forte do que venho sendo e aprender a não me importar. Prometo ser ainda mais atenta com quem realmente faz algo por mim. Prometo não deixá-los na mão e, se tiver de arranjar forças em um lugar qualquer para dar suporte a eles e a elas, continuarei fazendo de tudo. Prometo trancar-me numa bolha e olhar só para dentro de mim por algum tempo para, depois disso, virar meu foco unicamente para o exterior. Prometo pensar com cuidado na possibilidade de ir morar fora do estado pra fazer outra faculdade. Se for, prometo deixar atados os laços que me sustentam. E, se não for, prometo fazer o possível para deixar claro para os que aqui estão que eu existo. E estou aqui. Mesmo não sendo a pessoa mais importante e prioritária do planeta, eu sempre estive. Exatamente aqui. Pro que der, vier, não der e não vier.

Acho que, mais do que fazer, eu gosto de cumprir promessas.

sábado, 13 de junho de 2009

78 cadeiras. Ao passar mais de uma hora numa sala "vazia" (sim, as cadeiras são uma maravilhosa companhia), mesmo que as contas não sejam atraentes, a tentação de saber quantos objetos a observavam era acentuadíssima. Bom, eram 78 cadeiras vazias. E daí? Queria escrever isso, mas faltou-lhe impulso para pegar umas folhas quaisquer e pôr em prática o que se compunha em sua mente. Respirou fundo e moveu-se. Barulho de mochila, de pacotinhos de vita-C, e, finalmente, de folhas. Rasgou uma. Poderia tê-la tirado sem rasgar, mas, ao menos naquele momento, preferia a rapidez avassaladora à calma torturante. São só folhas, elas não interessam. Rabiscou um ou dois parágrafos, não gostou. Quis amassar, como sempre fazia. Talvez a situação merecesse um pouco mais, eram folhas rabiscadas que faziam-se inúteis. Rasgá-las parecia mais apropriado. Mas, onde jogá-las depois? Não havia lixeira na sala! (Precisava lembrar de reclamar disso junto aos funcionários, posteriormente.)

Mas ah... Quer saber? Ela não queria levantar-se dali. Eram muitas escadas e só ela sabe o quanto foi extremamente cansativo subi-las. Melhor guardar, mesmo. Lembrou-se da existência de uns envelopes na sua pasta. É, envelopes. Infelizmente, era plural. Acabou guardando os rabiscos dentro do mais pálido dos envelopes que ali se encontravam (por sorte, um ou outro ainda estava vazio) e pensou num possível destino para o conteúdo dos outros elementos que compunham aquele plural de papéis rabiscados, rebuscados e, provavelmente, ridículos. Talvez ela amassasse, como geralmente fazia com suas composições que não soavam bem. Talvez ela deixasse lá, naquele pálido envelope, e guardasse no fundo de uma gaveta qualquer, para ter o esquecimento como resultado. Eram só uns dois parágragos rascunhados sobre um monte de cadeiras vazias. Eram só papéis. Eles não são tão importantes assim. Talvez.